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Lorbé, o porto de águas esmeraldas que esconde uma carpintaria de ribeira

MARÍA SALGADO / tradução: MARCOS RANDULFE LA VOZ

VEN A GALICIA

Pepe Gómez constrói embarcações de madeira há cinco décadas. É dono de uma das 13 carpintarias da Galiza que resistem e mantêm esta atividade artesanal em pleno século XXI. A dele, em Oleiros, tem continuidade assegurada por um filho à cabeça da empresa

19 may 2023 . Actualizado a las 18:13 h.

O sol de abril atravessa as águas esmeraldas do pequeno porto de Lorbé, que é lindo sem saber. Batelões e barcos de pesca às cores, corvos-marinhos pretos, jangadas de mexilhões, gatos fugidios e um intenso cheiro marinho que convida a ficar ali encalhado, vendo passar as nuvens e as abertas desta primavera. Já tocaram as onze da manhã e o cais está cheio de atividade: bateleiros, redeiras e pescadores trabalham sem pausa na doca e nos paredões. Uma brilhante nave vermelha ao pé da rampa esconde, quiçá também sem saber, um tesouro do património cultural e marítimo do nosso país: a carpintaria de ribeira de Pepe Gómez, uma das 13 que resistem na Galiza em pleno século XXI.

Pepe é José Manuel Gómez Porto (Veigue, Sada, 1959) e constrói embarcações de madeira há cinco décadas. "Aprendi o ofício no estaleiro de Sada, com Emilio Babío. Comecei como aprendiz aos 14 anos e fizemos sete barcos, o maior deles com 23 metros de comprimento", recorda o artesão, que afronta a proximidade da reforma com a tranquilidade de deixar o seu varadouro nas mãos do filho. "O José Francisco já é quem manda, quem paga e quem organiza. O meu filho trabalha um pouco melhor do que eu porque é mais perfecionista e detalhista, tem mais agilidade e apura mais. Eu já fiz a minha parte, já não tenho nada a demonstrar", diz com orgulho.

Pepe Gómez, en su carpintería de ribeira en Lorbé, en el municipio coruñés de Oleiros
Pepe Gómez, en su carpintería de ribeira en Lorbé, en el municipio coruñés de Oleiros CESAR QUIAN

Após 30 anos em Sada, onde apostavam na fibra em relação à madeira, trabalhou um ano e meio no estaleiro da Corunha, mas já com vistas e planos no porto de Lorbé. "Aqui antes não havia nada, só a rampa-varadouro, que estava mal feita. Agora conseguimos que a levassem morrer ao fundo. Estou aqui há 20 anos e fizemos  seis embarcações de madeira; a maior delas foi um barco de pesca de 11 metros de comprimento para Pontedeume", conta, de olhos no casco de um enorme barco que está a reparar neste momento.

O artesanato que navega a sotavento

Três Pepes trabalham nesta carpintaria de ribeira solicitada além do Eo. A José Manuel, José Francisco e José Antonio -o pai, o filho e um empregado- não lhes faltam encomendas. "Estou aqui das 9 às 19 e muitos feriados. Em janeiro, fomos uma semana e pouco para Ondarroa, a 700 quilómetros, para reparar um barco de pesca de 24 metros que foi contra o dique e estragou a proa toda. E virá agora um barco de 14 metros de Lastres, nas Astúrias, para consertar. O dono disse-me que em Avilés já não há nenhum carpinteiro de ribeira", explica Pepe, que também tem muitos clientes de Malpica.

Carpintería de ribeira en Lorbé, Oleiros
Carpintería de ribeira en Lorbé, Oleiros CESAR QUIAN

Um verdadeiro prazer, com alguns dias maus: assim resume estes 50 anos de trabalho. "É muito bonito construir um barco de madeira; primeiro coloca-se a quilha e depois vão-se acrescentando as costelas. Gosto muito da madeira, o poliéster é tóxico. É preciso ter vocação; se não gostares, pouco podes fazer. Também é um trabalho complicado e laborioso, é preciso ter destreza", diz Pepe, que sente que o seu trabalho não é reconhecido. "Se não der para viver, não vale de nada ser artesão. Só vale o que te dá de comer. O melhor de reparar um barco é cobrar depois de acabar", brinca este homem de quase 64 anos, que construiu em novembro o seu último barco.

Os barcos do Pepe navegam, mas também estão encalhados em museus. No Museu Naval de Ferrol há três réplicas que são obra dele, de quando fez a tropa, entre 1979 e 1980. "Construí o casco da fragata Magdalena, que mede três metros e é de madeira de caoba; um galeão pequeno; e uma embarcação xeiteira para andar à sardinha. Outros artesãos fizeram a estrutura de pavimento, o mascarão de proa e os mastros", relembra este perito, que também reparou o barco-museu que está ancorado no cais de Burela.

Rampa del Puerto de Lorbé, en Oleiros
Rampa del Puerto de Lorbé, en Oleiros

Filho de marinheiro, confessa que olha muito para o porto de Lorbé, embora esteja muito abandonado, protesta. "Acho que é maravilhoso trabalhar aqui, além de ser o sítio onde fui criado, porque, embora tenha nascido em Veigue, aos oito anos viemos viver para Lorbé", recorda este amante da pesca que não acha muita piada à reforma. "Não sei quando me reformo, acho que vou continuar. Em casa não vou ficar; se não o casamento não resiste. Ficarei por aqui a fazer as minhas coisinhas", afirma, antes de procurar a fotografia do cavalo de pau que construiu para um dos netos.

Artesão sobrevivente de um ofício em decadência, é muito crítico com a falta de formação formal nesta disciplina e o pouco interesse da Administração. "A conselheira Rosa Quintana disse-me que apoiava muito a carpintaria de ribeira, mas não têm barcos de vigilância de madeira", queixa-se Pepe, que de todos os barcos que construiu ao longo da sua vida tem um preferido. "É o Ribera, de 18 metros. Tinha algo especial. Ao navegar, levantava. Já foi desmantelado", diz, com o olhar perdido nas rias de Ares e Betanzos como se o estivesse a ver.