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Fazer o Caminho de Santiago no inverno: conselhos, vantagens e inconvenientes

VEN A GALICIA

OSCAR CELA

Peregrinos experimentados dão as suas dicas sobre a roupa, a mochila o como organizar as etapas

03 feb 2022 . Actualizado a las 18:51 h.

Ver a neve sobre as palhoças de O Cebreiro, desfrutar do espetáculo dos rios, atravessar bosques nus onde apenas se ouve o silêncio... São algumas das experiências que oferece o Caminho de Santiago no inverno. Calçar as botas e pôr pés ao caminho nos meses mais frios do ano pode representar um desafio, mas há peregrinos que escolhem esta época para viver uma versão diferente das rotas jacobeias. Que recomendações nos dão?

"Tudo depende da rota que se escolher", diz Cristina García, que faz o Caminho nas quatro estações. "Se for o Caminho Francês, o Primitivo, de Inverno ou a Via da Prata, que são rotas de interior, vai-se se notar mais a diferença de temperatura. Se for um caminho da costa, como o Inglês, ou o Português ou até o de Fisterra e Muxía, as temperaturas são mais suaves", explica.


Cristina García (segunda da esquerda) fazendo o Caminho Inglês em dezembro passado.
Cristina García (segunda da esquerda) fazendo o Caminho Inglês em dezembro passado.

Que rota escolher

Ramiro Oliveira experimentou todas as rotas, menos a marítima, e recomenda optar pelos itinerários costeiros. "Chuva, vamos poder encontrar em todos os Caminhos e em qualquer época do ano, mas o Português tem mais serviços, temperaturas agradáveis e menos chuva a sul de Pontevedra do que à medida que nos formos aproximando de Santiago", explica. E sabe o que diz. Trabalhou em vários alojamentos compostelanos, tendo assim estado toda a vida em contacto com peregrinos. Algo que o levou a criar um site sobre as rotas jacobeias, em que oferece conselhos.

"O Caminho de Inverno, que evita as neves de O Cebreiro vindo pela zona norte da província de Ourense, é outro dos tipicamente recomendados para esta época. Dependendo do mês que se escolha, há menos serviços, mas planificando bem a viagem há alojamento que chegue", acrescenta.

Como organizar as etapas

A organização é uma das bases para fazer o Caminho de Santiago em qualquer época, mas no inverno este passo ganha importância. "A partir da ponte do 12 de outubro, muitos alojamentos fecham, por isso recomendo reservar com antecedência para não ter surpresas. Não é uma época para partir à aventura", diz Ramiro.

Ramiro Oliveira numa das últimas ocasiões em que fez o Caminho de Santiago.
Ramiro Oliveira numa das últimas ocasiões em que fez o Caminho de Santiago.

Outra das desvantagens de peregrinar nestes meses são as horas de luz. "Não é preciso correr nem se levantar às cinco da manhã para apanhar lugar no albergue. O problema não é chegar ao fim da etapa, mas sim o que fazer depois. Para quem quiser visitar sítios, vai ser de noite", explica o compostelano.

A Cristina tem a solução ao problema: "Começo a caminhar muito cedo para chegar ao fim da etapa com horas de luz e, se for necessário, reduzo as etapas. Em vez de fazer 28 quilómetros num dia, divido-os em dois". A maior parte das rotas dispõem de alojamentos em vários pontos de cada etapa, não sendo a dormida um problema. "Eu de noite não caminho porque quero ir vendo o Caminho e os sítios pelos quais passo. Prefiro fazer menos quilómetros em mais dias do que mais quilómetros em menos dias", reforça. Em qualquer dos casos, se a noite cair, é importante usar lanterna tipo mineiro, das que se colocam na cabeça, explica.

Como fazer a mochila

O equipamento necessário para partir para a aventura jacobeia no inverno é outro dos pontos fundamentais da planificação. "Cada pessoa tem uma forma de fazer o Caminho. Eu sou dos que levam pouca roupa, um par de mudas. Levo a mochila muito leve porque sei que o peso que se acumula e as dores de costas podem ser um problema e impedir desfrutar da experiência. Considero que é muito importante esquecer os "se por acaso", há lojas para comprar aquilo que for preciso", explica Ramiro.

Recomenda-se que o peso da mochila não ultrapasse 10% do peso da pessoa. Por isso, a Cristina dá uma dica para evitar carregar com muita bagagem: "A maioria dos albergues públicos tem onde lavar e secar a roupa. Eu o que faria seria planificar onde me vou alojar e se têm esses serviços disponíveis, o que permite poupar muito peso na mochila".

María Pedreda

Que roupa levar

Mas, que roupa se deve levar? "Depende muito da pessoa. Eu gosto de usar calções desde o nascer do dia e um corta-vento com forro polar de fecho para poder regular a abertura em função do frio que tiver. Também é boa ideia levar calças desmontáveis para passar das calças aos calções quando se entrar em calor", conta o Ramiro.

A melhor opção, de acordo com os peregrinos experientes, é optar por roupa técnica que permita a transpiração e, no caso de levar casaco, que seja leve. A capa de chuva, "necessária em qualquer época do ano", pode ser acompanhada de um guarda-chuva pequeno. Ambos recomendam também una gola para o pescoço. "Levava luvas e gorro se fizesse uma rota de interior", especifica a Cristina. Sobre a necessidade de levar protetor solar, acha que não sobra, mas considera mais importante levar um protetor labial para proteger os lábios do frio.

O Cebreiro, a entrada da Galiza do Caminho Francês, durante uma nevasca.
O Cebreiro, a entrada da Galiza do Caminho Francês, durante uma nevasca. ALBERTO LÓPEZ

O calçado deve ser impermeável e ter sido usado, para evitar que aleije os pés. Embora no verão se possa recomendar utilizar sapatilhas ou sandálias de trekking, que permitam uma maior transpiração, no inverno é melhor optar por botas de montanha. "Antes de começar a caminhar, é bom untar bem os pés com vaselina e pôr de seguida as meias. É importante procurar que estejam sempre secas e levar vários pares para ir trocando ao longo da etapa", recomenda a Cristina.

Uma experiência diferente

Mas a maior recomendação é, sem dúvida, atrever-se a peregrinar também no inverno. "Esta é uma época maravilhosa para fazer o Caminho. Há pouca gente, vê-se outro tipo de paisagem e pode se desfrutar da gastronomia típica destes meses. Um bom caldo de nabiças ou de grelos, por exemplo. Agora que vamos entrar na época do Carnaval, vai certamente ser possível comer em muitos sítios filloas, orelhas, roscas...", resume a Cristina. "O percurso é sempre o mesmo, mas dependendo da época do ano em que se fizer, o Caminho vai ser diferente", acrescenta.

A variação da paisagem é uma das razões que leva ambos os especialistas a recomendar peregrinar em todas as estações. Mas, se tivessem que apontar uma vantagem principal do inverno, seria que há menos gente. "Pode se fazer um Caminho mais interior, dentro de si próprio", explica o Ramiro, que acha que "há um Caminho para todos, em qualquer época do ano".