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Eis aqui as novas rotas do Caminho de Santiago segundo o Balcão do Peregrino

VEN A GALICIA

Óscar Vázquez

A instituição encarregada de expedir a compostela acrescentou nove itinerários às suas estatísticas, ao longo do ano 2022

21 oct 2022 . Actualizado a las 05:00 h.

No início do ano, antes de imaginar o recorde de peregrinos, quando as máscaras ainda faziam parte do outfit em espaços fechados e o certificado de vacinação era imprescindível na carteira, poucos se atreviam a prever o futuro próximo do Caminho de Santiago. O Balcão do Peregrino mostrava com timidez a chegada diária de uma mão-cheia de peregrinos. A situação é hoje muito diferente. Os itinerários estão agora repletos. Tanto, que até aparecem peregrinos em trajetos que, aparentemente, antes nem existiam. 2022 é não só um ano recorde em número de peregrinos, como no de caminhos que levam a Santiago. A proba está nas estadísticas do Balcão do Peregrino, que já indicam 19 rotas.

A 31 de dezembro de 2021, as estatísticas oficiais diferenciavam nove rotas: Caminho Francês, Caminho Português, Caminho Português da Costa, Caminho Inglês, Caminho Primitivo, Caminho do Norte, Caminho de Inverno, Via da Prata e Caminho de Fisterra e Muxía. A estas rotas juntava-se a categoria «outros caminhos», o que dava um total de dez.

Ao longo deste ano 2022, os «outros caminhos» começaram a ter nome. Mês após mês, a lista ampliou-se com a passagem dos peregrinos que por eles transitavam até duplicar, literalmente, as categorias. Às nove rotas juntaram-se outras nove: Caminho de Muros e Noia, Caminho de Barbanza, Minhoto Ribeiro, Geira e Arrieiros, Caminho do Mar, Caminho Esquecido, São Salvador, São Rosendo e a Via Céltica. Com menos serviços, mas também menos massificados, são os novos Caminhos de Santiago.

Caminho de Muros e Noia

Caminho da Ria de Muros e Noia, passando por Outes
Caminho da Ria de Muros e Noia, passando por Outes CARMELA QUEIJEIRO

Pedra a pedra, o Caminho da Ria de Muros e Noia une duas localidades marcadas pelos edifícios rochosos e as arcadas. O encanto marinheiro de Muros encontra-se a apenas 80 quilómetros do espetacular património de Santiago. Embora não sejam suficientes para obter a compostela, podem sê-lo para desfrutar da paz e da natureza. A rota foi reconhecida como oficial pela igreja em dezembro de 2020.

O itinerário tradicional parte de Muros, passa pela margem norte da conhecida como Ria da Estrela e pela Serra de Outes até chegar a Noia. De lá, avança para o interior através de Lousame, pela paroquia de San Xusto. Atravessa os municípios de Rois, por Urdilde, Brión, por Alqueidón, e Ames, por Bertamiráns, até chegar a Santiago. Além disso, existe uma variante que sai de Porto do Son e se estende em paralelo à margem sul da ria até se juntar com o itinerário original em Noia.

Em termos de divisão por etapas, o site da rota fala de 11 trechos. No entanto, se tomarmos como referência os restantes itinerários, com uma média de 20 ou 25 quilómetros diários, poderia fazer-se em três ou quatro dias.

Caminho de Barbanza

Sinalização do Caminho do Barbanza, em Ribeira
Sinalização do Caminho do Barbanza, em Ribeira

Os itinerários que partem da costa são muito populares ultimamente. Tanto, que o antes referido tem um vizinho a sul da ria. O Caminho de Barbanza, também conhecido como A Orixe, foi reconhecido como oficial em março de 2021. Liga o faro de Corrubedo, em Ribeira, com a capital galega a través de 120 quilómetros e seis etapas.

O Caminho de Barbanza segue o leito da ria de Arousa e o rio Ulla, conforme o fizeram, de acordo com a lenda, os despojos do apóstolo. Um percurso que permite percorrer a margem norte da paradisíaca ria arousana sem massificações. Partindo de Ribeira, passa pelos municípios de A Pobra, Boiro e Rianxo até começar a subida pelo rio Ulla através de Dodro. Em Padrón, junta-se ao percurso do Caminho Português.

Existe a possibilidade de realizar uma rota marítimo-fluvial com alguma das empresas que disponibilizam embarcações em Ribeira. Basta desembarcar em Padrón, no mesmo porto em que supostamente chegou o barco com os restos mortais de Santiago, e continuar os últimos quilómetros a pé.

Via Céltica

Porto de Laxe, um dos pontos de partida da Via Céltica
Porto de Laxe, um dos pontos de partida da Via Céltica BASILIO BELLO

Também com partida no litoral, mas já longe das pacíficas águas das Rías Baixas, chega a Via Céltica. Trata-se do itinerário histórico que seguia quem partia de algum dos portos da Costa da Morte ou da zona de Bergantiños, passando por Santa Comba. É uma das últimas rotas que se tornou oficial, tendo sido reconhecida em dezembro do ano passado.

Tem duas variantes. Uma, que sai de qualquer um dos portos de Bergantiños: Laxe, Ponteceso, Corme, Barizo, Malpica e Caión. Como se de uma teia de aranha se tratasse, os diferentes itinerários unem-se até formarem um só caminho ao chegar a Valenza (Coristanco). Os de Laxe e Ponteceso fundem-se assim em A Carga (Ponteceso). Corme (Ponteceso) e Barizo (Malpica) convergem em Nemeño (Ponteceso). Malpica e Caión (A Laracha) passam por Buño (Malpica) e continuam até Ponte Dona, onde se juntam ao percurso anterior. Após todas as rotas terem confluído em Valenza, esta variante norte passa por Agualada, Castriz e Carboeiro até chegar a Paramos, onde converge com a variante oeste.

A variante oeste é a que sai dos portos da Costa da Morte: Fisterra, Muxía, Cereixo, Ponte do Porto e Camariñas. Parte do percurso coincide com o do Caminho de Fisterra e Muxía, mas em sentido contrário, com as setas amarelas viradas para Santiago. Na realidade, trata-se apenas de três percursos diferentes, visto que o de Camariñas também passa por Ponte do Porto e Cereixo, a única diferença sendo o marco quilométrico em que se começa a caminhar. Este funde-se com o de Muxía em Quintáns (Muxía). Mais tarde, a rota converge em Romar (Vimianzo) com a que começa em Fisterra. Seguidamente, o caminho passa por O Sixto, Muíño, Vilar de Célticos, Santa Comba e Vilarnovo até chegar a Paramos.

Ambas variantes seguem juntas o seu trajeto até Santiago, passando por Portomouro. Embora a distância total varie em função do porto de partida, existe uma condição especial para quem quiser obter a compostela. Conforme indicado no site da Via Céltica, os peregrinos devem realizar dois itinerários: um partindo da Costa da Morte e outro de Bergantiños. Também é possível optar por combinar um dos percursos a pé com uma rota marítima a vela, se esta ultrapassar as 100 milhas náuticas.

Caminho da Geira e dos Arrieiros

Caminho da Geira e dos Arrieros, passando por A Estrada
Caminho da Geira e dos Arrieros, passando por A Estrada

Mudamos de ponto cardinal para descobrir as novas rotas que chegam de Portugal. O Caminho da Geira e dos Arrieiros, reconhecido pelas autoridades eclesiásticas de Braga e Santiago no ano 2019, dirige-se a Santiago através da província de Ourense e do interior da de Pontevedra. O seu traçado é bastante parecido com o de outro novo itinerário: o Caminho Minhoto Ribeiro. Uma situação que provocou mais de uma guerra de valores e polémica nos territórios que atravessa.

O itinerário entra na Galiza por Lobios, o que permite desfrutar do parque natural da Serra do Gerês. Durante as etapas iniciais na região, atravessa a fronteira luso-galaica em várias ocasiões. Continua o seu percurso pela província de Ourense através de Cortegada, A Arnoia, Ribadavia, Pazos de Arenteiro (Boborás), Soutelo de Montes, Forcarei, A Estrada (por Codeseda) e Pontevea, até chegar a Santiago.

Minhoto Ribeiro

Camiño Miñoto Ribeiro, ao passar por A Estrada
Camiño Miñoto Ribeiro, ao passar por A Estrada

A outra vertente da polémica, o Caminho Minhoto Ribeiro, segue um itinerário bastante parecido com o de Geira e dos Arrieiros, partindo de Braga. Enquanto o guia oficial da rota indica que também entra na Galiza por Lobios, o certificado com o qual a catedral o reconheceu como oficial em 2020 assinala que passa pelos municípios portugueses de Monção e Melgaço, sendo, portanto paralelo ao Minho no trecho de Pontevedra. Algo que impossibilitaria a entrada por Lobios.

Em qualquer dos casos, após ter entrado na Galiza, o seu itinerário é quase paralelo ao de Geira e dos Arrieiros, passando, portanto, por Cortegada, A Arnoia, Ribadavia, Pazos de Arenteiro (Boborás), Soutelo de Montes e Forcarei. É neste ponto onde se produz o maior afastamento de ambos os itinerários em território galego. O Caminho Minhoto Ribeiro desvia-se até O Foxo, em A Estrada, e passa por Vedra, onde se junta com a Via da Prata.

Caminho de São Rosendo


Ponte de Vilameá, em Lobios, por onde passa o Caminho de San Rosendo
Ponte de Vilameá, em Lobios, por onde passa o Caminho de San Rosendo CELANOVA&BEYOND

Com saída também de Braga, o Caminho de São Rosendo é outra variante das rotas que chegam de Portugal. Da mesma forma que acontece com os itinerários acima referidos, este acede à Galiza através de Portela de Home e tem em Lobios a sua primeira paragem na região. No entanto, nesta localidade orienta-se para nordeste, em direção a Bande, desviando-se de possíveis polémicas. Segue o seu percurso por Celanova —de onde provém o nome, visto que o santo exerceu uma grande influência no município durante a Idade Média— até chegar a Ourense, onde converge com a Via da Prata.

O Caminho de São Rosendo segue a histórica peregrinação da rainha consorte Isabel de Portugal, no século XV. Conhecida como Rainha Santa, realizou o seu caminho por Vía Nova. Daí este itinerário permitir descobrir a herança romana na região, assim como atravessar o parque natural transfronteiriço da Serra do Gerês. Existe também uma variante na última etapa (Celanova-Ourense) por um trecho do Caminho Natural, que segue o itinerário das diferentes calçadas romanas do acampamento de Aquis Querquennis, em Ourense, até à Foz, na província de Lugo, conforme indicam os registos do Ministério da Agricultura, da Pesca e da Alimentação.

Caminho do Mar


Um grupo de estudantes galegos a fazer o Caminho do Mar no verão passado, perto de Viveiro
Um grupo de estudantes galegos a fazer o Caminho do Mar no verão passado, perto de Viveiro

Vamos de sul para norte. E literalmente. O Caminho do Mar liga o Caminho do Norte com o Inglês, seguindo o relevo do Cantábrico. Bifurca assim do itinerário tradicional em Ribadeo e atravessa o litoral de Lugo, conhecido como A Mariña lucense, e de Ortegal até chegar à ria de Ferrol. Permite descobrir uma das zonas de costa mais desconhecida da Galiza, onde o mar salvagem forma tesouros naturais como a praia de As Catedrais, O Fuciño do Porco ou as falésias de Vixía de Herbeira.

O Caminho do Mar desvia-se do itinerário do Norte em Ribadeo e passa pelos municípios de Barreiros, Foz, Burela, Cervo, Xove e O Vicedo até entrar na província de A Corunha. Continua por Mañón, Ortigueira, Cedeira e Valdoviño até chegar a Ferrol, onde começa a rota inglesa. Existem variantes que, em vez de seguir toda a costa atlântica, vão para o interior em direção ao município de Neda, uma das primeiras paragens do Caminho Inglês.

Uma das particularidades deste atalho costeiro é que permite fazer duas peregrinações numa. Existe uma aldeia entre falésias, no município de Cedeira, chamada Santo André de Teixido onde se deve ir pelo menos uma vez na vida ou, como castigo, lá chegar depois de morto. Conforme indica o ditado galego, "vai de morto o que non foi de vivo". De acordo com a lenda, foi promessa que Deus fez ao santo ao ver que os peregrinos iam a Santiago, mas não ao seu templo.

Caminho de São Salvador

Catedral de Oviedo, final do Caminho de San Salvador
Catedral de Oviedo, final do Caminho de San Salvador PACO RODRÍGUEZ

Existem mais rotas que servem para passar de um itinerário ao outro. O Caminho de São Salvador é um exemplo que, fora das fronteiras galegas, liga a catedral de León, no Caminho Francês, com a de Oviedo, ponto de partida do Primitivo. O templo asturiano é, de facto, outro dos pontos de peregrinação católicos, visto que conserva numerosas relíquias que atraiam a devoção dos peregrinos na Idade Média. Assim o indica o ditado: "Quem vai a Santiago e não a Salvador, serve o criado e deixa o Senhor". Este itinerário até tem a sua própria credencial: a salvadorana.

Caminho Esquecido


Peregrinos em Villafranca del Bierzo, onde o Caminho Esquecido se une ao Caminho Francês
Peregrinos em Villafranca del Bierzo, onde o Caminho Esquecido se une ao Caminho Francês Senén Rouco

Também fora do território galego, encontramos o Caminho Esquecido. Trata-se de uma alternativa ao Caminho Francês que os peregrinos utilizavam para evitar as guerras na época da reconquista. Sai de Bilbau e passa pelas províncias de Burgos, Cantábria, Palencia e León até convergir com o itinerário Francês, em Villafranca del Bierzo.